Wednesday, September 16, 2009

Helde Puuraiuja - O Lenhador Generoso (Portuguese Version)

Há muito, muito tempo, um homem foi à floresta cortar árvores.
Parou junto de uma Bétula para cortá-la.
Quando se preparava para o fazer, a Bétula ao ver o machado nas mãos do lenhador suplicou-lhe:
- Por favor! Deixe-me viver! Sou demasiado nova e tenho muitos filhos ao meu cuidado, que sentirão muito a minha falta.
O homem ouviu as súplicas das árvores e seguiu para junto dum Carvalho, começando a cortá-lo.
Ao ver o machado, o Carvalho começou a suplicar.
- Por favor! Deixe-me viver! Eu ainda sou saudável e forte, as bolotas ainda estão verdes e não estão prontas para serem semeadas. Como irá a nova geração ter uma floresta de carvalhos se as sementes forem más?
Ao ouvir a súplica da árvore, o lenhador seguiu para junto dum Freixo, principiando a cortá-lo.
O Freixo ao ver o machado começou a suplicar:
- Por favor! Deixe-me viver! Eu ainda sou muito novo, ainda ontem pedi a minha noiva em casamento, o que será da pobrezinha se me deitar abaixo?
O homem ao ouvir as súplicas da árvore foi para junto dum Plátano, começando a cortá-lo.
Ao ver o machado, o Plátano começou a suplicar:
- Por favor deixe-me viver! Os meus filhotes ainda são muito pequenos, ainda não estão criados. O que será deles se me deitar abaixo?
Ao ouvir as súplicas da árvore foi para junto de um Amieiro.
Este, ao ver o machado no ar, começou a suplicar:
- Por favor! Deixe-me viver! Eu alimento muitos bichinhos com o meu suco. O que lhes acontecerá, se me cortares?
O homem ao ouvir as súplicas do Amieiro foi para junto de um Choupo e começou a cortá-lo.
Ao ver o machado, o Choupo começou a suplicar:
- Por favor! Deixe-me viver! Sou eu que, ao agitar os meus ramos, faço barulho e a meio da noite afugento os seres das trevas. Que acontecerá a este mundo se me deitares abaixo?
O homem ao ouvir as súplicas do Choupo foi para junto duma Cerejeira e começou a cortá-la.
Ao ver o machado, a Cerejeira começou a suplicar:
- Por favor! Deixe-me viver! Eu ainda estou em flor, e tenho de dar abrigo ao Tordo, para que ele possa cantar nos meus ramos. Onde irão as pessoas ouvir as lindas melodias dos passarinhos, se eles se forem embora da nossa terra porque me deitaste abaixo?
O homem ao ouvir as súplicas da Cerejeira foi para junto duma Sorveira* e começou a cortá-la. Ao ver o machado, a Sorveira começou a suplicar:
- Por favor! Deixe-me viver! Eu estou quase pronta para dar cachos de flores de onde se formarão as bagas. Elas servirão de alimento aos passarinhos no Outono e no Inverno. O que acontecerá aos pobrezinhos, se me cortares?
O homem depois de ouvir as súplicas das árvores começou a pensar: se não posso cortar as árvores de folha caduca, então vou tentar a minha sorte com as árvores de folha perene.
Foi, junto de um Abeto e preparou-se para cortá-lo.
O Abeto ao ver o machado no ar começou a suplicar:
- Por favor! Deixe-me viver! Eu ainda sou tão novo e forte, e tenho ainda de criar descendentes e ser viçoso no Verão e no Inverno para as pessoas poderem abrigar-se e apreciarem a beleza da Natureza. Onde é que elas encontrarão abrigo, se me deitares abaixo?
O Homem ouviu as súplicas da árvore e foi até ao Pinheiro. Preparava-se para o cortar, quando o Pinheiro ao ver o machado, suplicou:
- Por favor! Deixe-me viver! Eu ainda sou novo e forte. Eu tenho que me manter viçoso juntamente com o Abeto. Seria uma vergonha se me cortasses.
O homem ouviu as súplicas do Pinheiro e foi junto dum Zimbro. Ao começar a cortá-lo, a árvore suplicou-lhe:
- Por favor! Deixe-me viver! Sou o maior tesouro da floresta, e trago a todos boa sorte, porque consigo curar noventa e nove doenças. O que seria dos humanos e dos animais se me deitasses abaixo?
O homem sentou-se nas ervas e começou a pensar:
- Esta situação é mirabolante, todas as árvores têm as suas razões e argumentos para não serem cortadas. Que farei eu, se não consigo encontrar uma árvore que se deixe abater. As súplicas das folhas fazem-me doer o coração… Se não tivesse mulher em casa, ir-me-ia embora de mãos vazias.
De repente, aproximou-se um velho homem com uma grande barba cinzenta, uma camisa cinzenta escura e um casaco feito de casca de abeto, ficou imóvel à entrada da floresta, de frente para o lenhador e disse-lhe:
- Olá, porque estás para aí sentado tão triste? Alguém te magoou?
O Lenhador respondeu:
- Como não hei-de estar triste? Esta manhã, peguei no machado e vim até à floresta. Queria cortar alguma lenha para levar para casa. Mas, de repente, algo inexplicável aconteceu. Descobri que a Floresta estava viva e que as árvores pensavam e conseguiam falar. Todas elas suplicaram-me, e o meu coração não teve argumentos suficientes contra os delas. Ou seja, eu não consigo cortá-las, uma vez que elas estão vivas e falaram comigo!
O velho homem olhou para o lenhador com um ar feliz e disse-lhe:
- Agradeço-te do fundo do coração, camponês, por não teres fechado os teus ouvidos às súplicas dos meus filhos. Nada de mal te acontecerá, devido à tua generosidade. Eu quero retribuir-te o favor e assim não quero que no futuro vivas com qualquer tipo de necessidades. Todas as árvores salvas contribuirão para a tua felicidade. Não só terás sempre lenha, como a tua casa será abençoada para sempre. Assim, de futuro, não terás de te preocupar com nada, apenas deves dizer o que o teu coração deseja e obtê-lo-ás. Contudo, terás que ter consciência do que desejas. Não peças algo demasiado alto. E, avisa a tua mulher e filhos para pensarem bem no que pedem. Os desejos não podem ser muito ambiciosos pois ao serem realizados correm o risco de serem infelizes. Aceita este ramo de ouro e toma bem conta dele.
Dito isto, deu o ramo de ouro ao Lenhador e acrescentou:
- Se quiseres construir uma casa ou qualquer outra coisa útil, vai até junto de um formigueiro e agita o ramo três vezes, mas com cuidado, para não magoar os pequenos seres. Diz-lhes o que pretendes que te façam e verás que na manhã seguinte terás o que desejaste. Quando desejares comida é só ordenar à panela para que te faça a comida que desejas. Quando desejares algo doce, é só mostrares o ramo dourado às abelhas e elas farão o seu trabalho. Elas dar-te-ão mais mel do que a tua família conseguirá comer. Quando quiseres sumo ordena à Bétula e ao Plátano. Eles concretizarão o teu desejo de imediato. Se lhes pedires, o Amieiro dar-te-á leite e o Zimbro saúde. Pratos de peixe e de carne serão confeccionados na panela, sem que tenhas que matar algum animal. Quando desejares tecidos de linho, seda ou lã, agita o ramo para que ele comande as aranhas para tecerem o que desejas. Assim, não perderás tempo com nada e poderás aproveitar o teu tempo muito melhor. Tudo isto é para ti, porque escutaste as súplicas dos meus filhos e deixaste-os viver. Eu sou o Espírito Silvestre, ou melhor, O Pai da Floresta. Sou eu que tomo conta de todas as árvores desta floresta. De seguida o velho despediu-se e desapareceu.
O Lenhador tinha uma mulher muito antipática, que o aguardava em casa, sempre com um ar de zangada. Quando o viu chegar de mãos vazias, ainda mais zangada ficou. A mulher gritou-lhe:
- Onde está a lenha que ficaste de trazer?
O homem respondeu calmamente:
- A lenha ficou na floresta, a crescer!
A mulher, furiosa, começou a gritar:
- Ah! Quem me dera fazer uma palmatória com o ramo de uma bétula e bater-te nessas costas!
O homem agitou o ramo dourado e sussurrou de forma que a mulher não o ouvisse:
- Este desejo ser-te-á concedido!
De repente a mulher começou a chorar e a queixar-se:
- Ai! Ai! Ai! Isto dói, ai! Ai! Está a acertar-me em cheio. Ai, ai! Ai! Por favor, desculpa-me pelo que disse.
Ela gritava e pulava de dor, esfregando os sítios onde o ramo lhe batia. Quando, finalmente o lenhador achou que a mulher já tinha sido suficientemente castigada, ordenou ao ramo dourado que parasse de bater.
Depois disto, o lenhador começou a perceber como era valiosa, a oferta que o velho da floresta lhe havia dado.
O Lenhador tinha um velho celeiro, no quintal e decidiu testar novamente o ramo dourado com as formigas. Foi até junto do formigueiro, agitou o ramo dourado três vezes e gritou:
- Construam-me um novo celeiro no meu quintal!
E na manhã seguinte, quando acordou, lá estava, o novo, celeiro pronto.
Não havia homem mais feliz no mundo do que o nosso lenhador.
Eles não precisavam de se preocupar com a cozinha. Pois a panela fazia tudo o que o lenhador mais desejava comer. As aranhas teciam os tecidos, as toupeiras aravam e as formigas semeavam os campos. No Outono, as formigas também colhiam o que haviam semeado. Ou seja, ninguém da família do Lenhador precisava de se preocupar em fazer coisa alguma. E quando, a mulher do Lenhador começava a fazer críticas ou a desejar algo muito mau, sentia novamente o poder do ramo dourado.
Nestes momentos alguns homens diriam: quem me dera ter também um ramo dourado!
O Dono do ramo dourado viveu sempre feliz, porque nunca desejou nada que não fosse possível realizar.
Antes de morrer, o lenhador deu o ramo dourado aos seus filhos e ensinou-lhes tudo o que o Espírito Silvestre lhe havia ensinado. Como deviam tratar o ramo delicado e avisou-os dos perigos de desejarem coisas impossíveis.
Os filhos fizeram tudo como o seu velho pai lhes ensinou e viveram felizes, até ao fim dos seus dias.
Mais tarde, na terceira geração, o ramo dourado foi herdado por um homem, que não ligou importância aos avisos dos seus familiares. Ele, inadevertidamente, formulou desejos impossíveis de realizar e provocou o desgaste do ramo dourado.
A princípio, os seus desejos não provocaram grandes estragos, uma vez que eram possíveis de realizar. Mas depressa, o arrogante homem ficou farto dos desejos realizados e começou a testar a força do ramo dourado formulando desejos cada vez mais complicados de se concretizarem.
Até que um dia, o homem desejou que o ramo dourado trouxesse o sol cá abaixo, para lhe aquecer as costas. O Ramo dourado, concretizou o desejo do homem, mas como era algo impossível, disparatado, aconteceu algo terrível: tudo à volta do homem ficou demasiado quente, e o sol acabou por queimá-lo, bem como a todas as suas casas e campos. Não sobrou nada. Nem o mais pequeno vestígio da quinta. Portanto, ninguém sabe onde era essa quinta ou onde procurar o ramo dourado.
Acredita-se também, que as pequenas partes quentes do sol, assustaram tanto as árvores que elas esqueceram a sua linguagem e nunca mais voltaram a dizer uma só palavra.


* - Tramazeira (ou Sorveira) – árvore comum em climas frios, existe muito na Serra da Estrela, é conhecida pelos dois nomes, escolhe o que mais gostares.